Maturidade Cristã: um caminho contínuo e necessário


“A meta é que todos juntos nos encontremos unidos na mesma fé e no conhecimento do Filho de Deus, para chegarmos a ser o homem perfeito que, na maturidade do seu desenvolvimento, é a plenitude de Cristo. Então, já não seremos crianças, jogados pelas ondas e levados para cá e para lá por qualquer vento de doutrina, presos pela artimanha dos homens e pela astúcia com que eles nos induzem ao erro. Ao contrário, vivendo amor autêntico, cresceremos sob todos os aspectos em direção a Cristo, que é a Cabeça. Ele organiza e dá coesão ao corpo inteiro, através de uma rede de articulações, que são os membros, cada um com sua atividade própria, para que o corpo cresça e construa a si próprio no amor”. (Ef 4,13-16)
A Palavra de Deus, durante os séculos, vem iluminando a caminhada de cada discípulo em particular e de toda a Igreja no seu conjunto. O Novo Testamento, de modo inequívoco, mostra como a Igreja, nos seus inícios, conseguiu sobreviver às várias investidas que vinham de dentro e de fora dela, além das investidas do Inimigo do Povo de Deus. A Bíblia não deve ser utilizada como livro de auto-ajuda e nem como livro de adivinhação ou de acusação. Os relatos bíblicos, por si só, se impõem como luz para a caminhada hodierna dos discípulos de Cristo, sem que seja necessário “forçar a barra” para mais ou para menos.
Esta passagem bíblica em particular nos apresenta um caminho para se alcançar a tão pretendida e necessária maturidade cristã. Nesse ponto, São Paulo coloca a maturidade no âmbito da perfeição. E sabemos que a perfeição, dentro da espiritualidade bíblica, é santidade. Em assim sendo, quem avança na maturidade caminha no sentido da santidade, que é a nossa grande meta. Nas palavras do apóstolo Paulo a maturidade é importante porque com ela “já não seremos crianças, jogados pelas ondas e levados para cá e para lá por qualquer vento de doutrina, presos pela artimanha dos homens e pela astúcia com que eles nos induzem ao erro. Ao contrário, vivendo amor autêntico, cresceremos sob todos os aspectos em direção a Cristo, que é a Cabeça”.   
É impressionante notarmos, à medida que caminhamos, quantas e quantas pessoas fracassam no quesito maturidade. Pessoas boas, que rezam, que participam dos encontros, que evangelizam, mas que, no dia a dia, se mostram extremamente imaturas. Tal situação é complicada e requer acompanhamento constante, pois isso não constrói. Muito pelo contrário, atrapalha de modo significativo a caminhada discipular de toda a Obra DJC e, por conseguinte, da Igreja.
Certamente, nenhum de nós é totalmente maduro. Ainda estamos longe. E essa é a regra da vida: vamos amadurecendo aos poucos, a partir da resposta que somos capazes de dar em cada situação que se coloca diante de nós. Ser imaturo não é pecado. O erro consiste em permitir que as nossas imaturidades nos sufoquem e prejudiquem não somente a nós, mas a todo um conjunto. Dessa forma, a nossa imaturidade, em determinados momentos, vai aflorar. Mas ela não pode, sob nenhuma hipótese, comprometer a nossa caminhada pessoal e muito menos comunitária. 
E é isso que, via de regra, acontece na caminhada discipular. No próprio DJC tal situação vem se repetindo numa velocidade preocupante. É preciso, antes de tudo, que cada discípulo possa pedir ao Senhor e fazer todo o esforço humano necessário para dar passos no sentido de um amadurecimento mais rápido e consistente, de modo que os frutos sejam sentidos no dia a dia da caminhada.
Vejamos só o que nos alerta o Documento de Aparecida a cerca do processo de amadurecimento cristão: “a pessoa amadurece constantemente no conhecimento, amor e seguimento de Jesus Mestre, aprofunda no mistério de sua pessoa, de seu exemplo e de sua doutrina. Para isso são de fundamental importância a catequese permanente e a vida sacramental, que fortalecem a conversão inicial e permitem que os discípulos missionários possam perseverar na vida cristã e na missão em meio ao mundo que nos desafia”.
É só ir seguindo os passos acima mencionados pelo Documento de Aparecida, bem como as orientação dadas pelo DJC e cada um de nós vai, aos poucos, crescendo na maturidade. Trabalhar os sentimentos e as emoções é um caminho extremamente necessário. As imaturidades nascem, justamente, no coração e na mente de pessoas que ainda não conseguiram resolver bem o seu passado e que, infelizmente, ainda não têm paz completa com seus sentimentos e emoções. É um trabalho longo e cheio de tropeços, mas, sem sombra de dúvidas, imprescindível para o bom andamento da caminhada discipular pessoal e comunitária.
Como já disse, quando alguém age com imaturidade ela não só se prejudica. Prejudica também a caminhada de todo o DJC, uma vez que o discípulo que age com imaturidade traz para si a atenção que deveria ser despendida para as pessoas que estão sendo evangelizadas. O segredo é, como diz o Documento de Aparecida, perseverar mesmo em meio a imaturidade e tentar, a todo custo espiritual e psicológico, superar estas imaturidades.
E quando estas imaturidades fizerem parte da nossa personalidade? Nessa situação em particular é necessário que aprendamos a conviver com elas e não permitir que elas sejam capazes de afundar o nosso barco pessoal ou o barco da caminhada coletiva. Na base da oração e da decisão diária é preciso ir pedindo ao Divino Espírito Santo para que todas as áreas de nossa vida sejam curadas e libertadas de tudo aquilo que nos puxa para o fundo do poço. Em casos muito complexos pode ser necessária, quem sabe, até mesmo uma ajuda profissional de um psicólogo.
Por fim, tem outro ponto importante que precisa ser meditado: geralmente os discípulos imaturos, quando se encontram em situações conflituosas, colocam à disposição o seu ministério, o seu serviço. No meu entendimento, antes de qualquer coisa, agir dessa forma é uma prova concreta, pelo menos nessa situação, de falta de amor e, até mesmo, de responsabilidade, pois não é tão fácil encontrar um novo discípulo para se colocar no lugar de quem entrega o seu ministério. 
Quem procede dessa forma, especialmente quem tem uma longa caminhada no DJC, sinaliza que não aprendeu muita coisa ao longo do caminho ou, se aprendeu, está fazendo de conta que não aprendeu. Em qualquer um dos casos fica evidenciada a falta de caridade. A entrega do ministério ou do serviço só deve ser realizada em casos extremos. Casos corriqueiros como, por exemplo o desentendimento entre irmãos ou pessoas responsáveis pela Obra DJC, não devem ser, a priori, motivo de colocar a sua missão à disposição.
Já pensou se todo e qualquer conflito dentro do DJC, na Igreja no seu conjunto e na sociedade como um todo, fossem resolvidos com a entrega de seu serviço? Seria uma balburdia total. Cada qual com aquele “cheio de não me toque”, se achando acima do bem e do mal ou com a falsa pretensa de que não querer ser corrigido.
Peçamos ao Senhor que nos ajude nessa longa caminhada no crescimento da maturidade cristã.

Francisco Edmar
AGDI

Entrevista Padre Zezinho






Sempre notei que a nossa Igreja possui um patrimônio doutrinal milenar e riquíssimo, mas que foi e é pouquíssimo explorado. Se pegarmos só os documentos que foram escritos durante o Concilio Vaticano II ficaremos impressionados com toda a sua riqueza e, apesar de terem sido escritos há muito tempo atrás, guardam uma contemporaneidade surpreendente. 

Não tenho nada contrário ao que se escreve hoje. Mas se compararmos ao que a Igreja já nos disponibilizou, acho que estamos aproveitando muito pouco. Certamente, mesmo com essa abundancia de alimento que já foi nos oferecida, o povo de Deus permanece na fome. Podemos e devemos “usar” o novo que está sendo lançado, mas sem nunca esquecer de beber na fonte primeira que são os documentos oficiais da Igreja.

Na entrevista a seguir, Padre Zezinho aborda alguns temas importantes. Como ele não é Deus não acerta em tudo. Não concordo com tudo o que ele fala na entrevista. Acho que ele poderia evoluir em alguns posicionamentos. Entretanto, vejo que a entrevista, no seu conjunto, serve para a evolução da nossa reflexão enquanto Igreja Católica. 




Quando ele descobriu que a música era o “chantili” da catequese na Igreja, Fábio de Melo, Marcelo Rossi e Reginaldo Manzotti não tinham sequer nascido. Sem “condenar” os religiosos midiáticos, Padre Zezinho explica que escolheu um outro projeto de vida, tipo mangueira: “leva dez ou 15 anos para dar fruto, mas depois dá manga por muito tempo”. E já são 45 anos, longe de holofotes, como padre-cantor, título que recebeu na década de 1980 quando ganhou o Brasil e o mundo, mesmo dispensando convites da Rede Globo. “Não é o tipo de programa que serve de cenário para minha canção”, justifica, referindo-se a Faustão e companhia, na TV aberta.

Sua fala, sempre articulada e embasada em documentos da Igreja Católica, critica o imediatismo do mundo moderno que busca determinar quando Deus fará o milagre, define quem é o artista da vez, desestimula a leitura, tira a autoridade dos pais e escraviza através do “www”.

Padre Zezinho tem uma formação musical eclética, iniciada com o pai violeiro e refinada em suas viagens pelo mundo, inclusive na Espanha, onde esteve durante a Ditadura Militar no Brasil. A preocupação com a vida em comunidade e com a política acompanham suas pregações. “Eu falo de Deus, falo do próximo e falo do ‘eu’ no meio dos outros. Tenho que viver para o outro, porque se viver para mim é uma discrepância gigantesca”. Na conversa a seguir, ele defende uma maior inserção dos católicos no Parlamento, assim como fazem os evangélicos, e lembra que sempre foi difícil ser um bom cristão. Mas é preciso persistência.


O POVO - São 45 anos como sacerdote e comunicador. Houve um momento específico, claro, de seu chamado para ser padre?

Pe. Zezinho - Queria ser padre desde os nove anos. Meu pai era paralítico e quem dava assistência à minha família, pobre, eram os padres do instituto de teologia a 100 metros da nossa casa. Acostumei-me como coroinha e vendo que eles cuidavam dos pobres e da vila de operários onde eu morava. Então, nasceu aos poucos a ideia de fazer o que eles faziam: cuidar de pobre e trabalhar em comunidades carentes.

OP – A paralisia de seu pai foi um acidente?

Pe. Zezinho - Meu pai era tropeiro, conduzia gado de Minas para São Paulo, e também media terras. Um dia sofreu um acidente, o cavalo passou por cima dele, afetou a espinha. A paralisia foi progressiva, mas ele conseguia mexer com a mão. Era violeiro. Por um lado, (o acidente) foi providencial, porque eu convivi com ele e com suas histórias, e ao mesmo tempo eu vi a dor e o sofrimento que ele enfrentou com muita serenidade. Mais tarde minha mãe veio a amputar as duas pernas devido a diabetes. Eu vivi numa família onde se ensinava que ter problemas na vida não é o mesmo que ter uma vida infeliz. A nossa foi feliz apesar dos problemas. Meu pai morreu quando eu fiz 11 anos. No comecinho de 1952. E dali por diante eu estava por conta dos padres que cuidavam da nossa família e foram eles que conseguiram benfeitores para pagar os meus estudos. E hoje eu retribuo para a minha congregação tudo o que ela fez por mim. E, certamente, não existiria o Padre Zezinho se uma congregação não tivesse acreditado nesse menino pobre.

OP - E como foi recebida pelos seus pais a decisão de seguir a vida religiosa?

Pe. Zezinho – Meu irmão mais velho foi primeiro para o seminário. Desistiu. Minha mãe era costureira e cozinheira dos padres, muito devota do Coração de Jesus. Recebeu com muita alegria (a decisão). Ela foi sábia dizendo: “olha, o teu irmão foi mas não continuou. Você veja o que quer”. Eu disse: “vou arriscar”. Fui e continuei.

OP - E o gosto musical, o senhor atribui a seu pai?

Pe. Zezinho – Sim. Minha família era muito musical. De vez em quando os tios vinham visitar, contavam causos e cantavam toada mineira, moda de viola. No seminário, recebi a influência da música italiana e da música alemã. Eu já tinha a música mineira no sangue, a paulista, porque morávamos em Taubaté, para onde fui com dois anos de idade, a música interiorana tipo Tonico e Tinoco, e mais tarde a influência estrangeira, as músicas populares da Itália e da Alemanha. Depois fui para os EUA e morei numa região de blues, era muito comum o country. Também me influenciou. E depois tive a chance de estudar na Europa. Lá, bebi da música grega, da portuguesa e me interessei muito pela música russa. Isso tudo foi formando em mim um conceito musical. As pessoas dizem que minha música serve em qualquer país exatamente por essas influências.

OP - Quanto tempo foi essa sua passagem no Exterior?

Pe. Zezinho – Quatro anos nos Estados Unidos e um na Itália. Depois viajei muito. Passava três meses na Argentina, no México, na Espanha. Logo nos meus primeiros dez anos de padre.

OP – E como foi ter de sair do Brasil por causa da Ditadura?

Pe. Zezinho - Eu fui ameaçado várias vezes, tive que me mudar para a Espanha e fiquei lá sete meses. Por ter falado naquele tempo o que falo agora. Uma vez ganhei ordem de prisão em Belo Horizonte porque disse que estava com saudade do tempo em que a gente podia votar e que eu queria uma juventude que se rebelasse e lutasse pelos direitos de ser cidadã, e não uma juventude revoltada. Porque revoltada vai e destrói tudo. Dom Paulo (Evaristo Arns) tomou minha defesa junto de Dom Eugênio, do Rio de Janeiro, e não fui preso. Mas logo depois fui para a Espanha. Meus superiores pediram para eu ir para lá porque estava marcado. Na mesma época prenderam Frei Betto, a repressão estava violenta. Eu não sofri nem um décimo da perseguição que outros sofreram.

OP – Por quê?

Pe. Zezinho - Alguns pregavam abertamente uma postura de esquerda e eu pregava uma postura social democrática. Meu modelo não era e não é Cuba. E também não era e não é os Estados Unidos. O capitalismo massacra as pessoas com seu poder de compra. E no Congresso massacra com seu poder de compra de deputados. Não somos ainda uma República que discute. Nos deixamos levar pela pressão do momento e pela vantagem. O Brasil vive isso há muito tempo: “vá com o vencedor”, “fique com o que está no primeiro lugar e aí será vitorioso”. Acho que é vitorioso quem tem opinião e corre todos os riscos para dizer o que pensa.

OP - Para o senhor, hoje, há menos interesse dos jovens em seguir a vida religiosa?

Pe. Zezinho – Não aumentou, nem diminuiu. A grande pergunta é: e depois?. Temos que perguntar se os novos movimentos que trabalham muito a sensibilidade e o sentimento, mais que o conhecimento e a razão, vão durar muito. A catequese deve ser durável e progressiva. É nessa tecla que eu bato. É preciso colocar ideias perenes e não canonizar só o momento. Tem que haver uma base cultural sólida para se trabalhar com a juventude e para fazer música religiosa também.

OP - E os movimentos hoje seguem que linha?

Pe. Zezinho - Trabalham muito o marketing. E o marketing, todo mundo sabe, é para consumo. Faz, terminou, faz outro, faz outro. Na cultura, as coisas que tinham conteúdo sólido duraram. Até hoje todo mundo canta “não há, ó gente, oh não, luar como esse do sertão”. E um samba muito simples como “a estrela Dalva no céu desponta” (cantarola). É porque a melodia é durável, o conteúdo é durável e fácil de guardar.

OP - Embora o senhor faça centenas de shows, o senhor não está na TV. Isso é uma escolha?

Pe. Zezinho - Se você vai à praia para se bronzear, tem que ficar pouco tempo debaixo do sol. A moça que fica de seis até 18 horas sai de lá com bolhas, e não bronzeada. Os holofotes funcionam como o sol. Se você se expõe demais, queima a sua imagem. Então, eu não permito que ponham meu rosto na capa de livro. A mensagem tem que ser mais forte que o mensageiro.

OP - Mais especificamente na religião...

Pe. Zezinho - A minha mensagem é bíblica e é da Igreja. Não coloco o meu rosto no livro porque tudo o que estou dizendo ali aprendi em algum lugar da Igreja. Ponho o meu nome como alguém que aprendeu, mas a centralidade do meu trabalho não está no meu rosto. Uma vez eu pus quando era novinho. Depois refleti e vi que nunca mais. Escolho muito cuidadosamente os programas de auditório que vou, porque não me vejo cantando Oração pela família no Faustão com as moças vestidas daquela maneira atrás. Não me vejo cantando uma canção de espiritualidade no Gugu e também não me vejo cantando uma canção de família no Ratinho. Não é o tipo de programa que serve de cenário para a minha canção.

OP - E a audiência?

Pe. Zezinho - A audiência não justifica ir à televisão. Se alguém descobrir o meu livro, a minha canção, e contar para o outro, o efeito é muito maior. E depois de 45 anos cantando e indo pouquíssimo à TV, apesar disso, posso dizer que sou conhecido por pelo menos 100 milhões de brasileiros. Comunidades católicas, hospitais, creches, asilos, paróquias e colégios são suficientes para divulgar uma mensagem católica. Acredito plenamente que se uma mensagem é forte alguém conta para o outro. Pode dar certo ou não, mas é uma escolha que fiz. Com o excesso você corre o risco de cansar muito mais rapidamente o público e de se cansar. Fica parecendo a formiga que, ao invés de levar um pedaço da folha, leva a folha inteira. Não vai chegar ao formigueiro.

OP - E os padres que fazem isso?

Pe. Zezinho - É que eu fiz um projeto tipo mangueira. Leva dez ou 15 anos, mas depois dá manga por muito tempo. E eles podem ter feito um projeto mais urgente. Quem quiser se tornar conhecido urgentemente deve fazer um contrato com a Globo ou com a Sony, e em dois anos será conhecido no País inteiro, porque eles providenciarão que você vá a todos os programas. A mesma oferta me foi feita três vezes e eu disse não. Eu não saio das Paulinas e também não deixo a minha congregação. Continuarei sacerdote dehoniano. Se um dia gostarem de alguma coisa minha, façam um contrato com as Paulinas. Quem é meu amigo é amigo para sempre. Eu não troco por questão de maior público, mas se alguém fizer isso eu não condeno. Depende do prazo que você se dá.

OP - A evangelização através da música é mais eficaz?

Pe. Zezinho - Nós não podemos canonizar a música. O bolo sem chantili é gostoso do mesmo jeito. Catequese sem música é muito boa, missa sem música é maravilhosa. Agora, a música é um chantili que acrescenta algum sabor especial ao bolo da vida e ela nunca pode ser mais importante do que a palavra falada ou escrita. Fui ordenado para pregar a palavra de Deus e em nenhum momento o bispo me mandou cantar. A canção é algo que veio depois, até enfeita, mas não pode ser a razão central do meu sacerdócio. Muitas vezes aconteceu de eu perder grandes oportunidades porque me neguei a ir só cantar.

OP - Uma de suas músicas mais marcantes é Oração pela família. Como está família hoje?

Pe. Zezinho - Desde que a humanidade escolheu os números e a vendagem como objetivos principais da comunicação ficaram sacrificadas a qualidade e a família. Os pais perderam a autoridade. A Igreja, o Estado e a escola também. Os pais, que vivem todos os dias com os filhos, às vezes não conseguem dar uma mensagem para eles. Mas os filhos estão abertos à internet e à mídia. Quem vem de fora tem mais influência sobre eles do que quem convive. Os pais deviam ser um semáforo que fica mais tempo no verde, mas quando é amarelo é amarelo e quando é vermelho é vermelho mesmo. Têm que aprender a proibir o suficiente e permitir muito mais, porém para isso precisam oferecer um amarelo que é um ‘prepare-se’, reflexão. Isso tem faltado. Vivemos numa sociedade voltada para o indivíduo, superficial demais, imediatista demais e que se entregou totalmente ao marketing. Hoje acentuaram-se demais o efêmero, o emotivo, e esquecemos de ensinar o Brasil a pensar. Políticos votam às vezes sem pensar, o povo vota nos políticos sem pensar. As pessoas mudam de igreja sem pensar. Canonizou-se a novidade esquecendo da qualidade e do conteúdo. Toda vez que você se deixa levar pela onda do momento você é surfista, não é um catequista.

OP - Nesse cenário, o senhor é otimista ou pessimista?

Pe. Zezinho - Sempre foi difícil ser um bom cristão, ser um bom católico, e sempre foi fácil aderir à ideia do momento. Temos que ter a capacidade de pregar com nexo e perspectiva. Pregar o Cristo da fé e o Cristo histórico. Ninguém consegue fazer isso se não ler muito. E nós somos uma sociedade carente de livros, as igrejas também são. A Igreja fala muito bonito, mas não chega ao povo. Chega a parte que o pregador gosta de mostrar, mas os jovens continuam sem saber o que a Igreja disse, o que disse João Paulo II.

OP - Seria uma falha na formação dos padres?

Pe. Zezinho - Acho que isso é imediatismo. Nós queremos resultado. Não existem as igrejas que pregam o Cristo com resultado? Não há até a hora para o milagre? Domingo às três da tarde vá lá que vai acontecer milagre. Isso é imediatismo. Outros oferecem missa de cura e libertação. Por acaso as outras missas também não são de cura e libertação? Por que eu vou só naquele padre que diz que vai ter cura e libertação se a Igreja não permite que dê esses nomes para as missas? Toda missa é de cura e libertação. Deus é que vai decidir se cura e liberta alguém. É uma missa de pedido. Outros dizem: “faça por mim uma oração de poder”. Não conheço nenhuma. Só conheço oração de pedir. Quem tem poder é Deus. Vejo muita gente abençoando e dizendo: “que Deus possa te abençoar”. Por acaso Deus não pode? Então, que Deus te abençoe agora. Temos que ter palavras com maior precisão. Certas ideias entram na Igreja e ficam grudadas que nem cupim no pasto, não saem mais e são ideias erradas.

OP - O senhor acha que a compreensão entre as igrejas está mais próxima hoje?

Pe. Zezinho – É mais fácil dialogar com as igrejas históricas: luteranas, metodistas, batistas, adventistas. Já têm uma caminhada. É um pouco mais difícil com as neopentecostais pois elas acreditam e ensinam que elas é que são o novo da fé, que você está errado. O verdadeiro diálogo ecumênico é: “pode falar, eu vou concordar e vou discordar, mas quero ouvir você”. Hoje algumas igrejas não ouvem, só falam. Nós precisamos nos libertar de slogans e marketing perigosos, e fazer bom uso dos meios de comunicação sem nos escravizar a eles. Porque o “www” também escraviza, e a era digital é escravizante. Jesus diz que não devemos nos impressionar pela fé como espetáculo. O reino de Deus é como uma semente que está crescendo. Não estamos nos dando tempo para a fé amadurecer nos jovens. A maioria das igrejas está cometendo o pecado de queimar etapas. Há pregadores pensando que se pular para a próxima fase, não terminar a primeira, vão chegar longe.

OP - Como o senhor avalia a inserção dos grupos evangélicos em demandas políticas?

Pe. Zezinho - Nós devíamos fazer o mesmo. A Igreja Católica já fez muita política no passado e chegou aos parlamentos. Nós não devíamos desistir da política. Temos que preparar leigos e se possível até sacerdotes para representar o povo no parlamento. Sou a favor de fazer política. Eu não faço porque não tenho essa vocação, mas se alguém tem e o bispo permitir, acho que deve ir, pois é lá que se fazem as leis.

OP - Nos seus shows e nas suas pregações o senhor fala dessa questão eleitoral?

Pe. Zezinho - Minha pregação é profundamente religiosa e profundamente política. Não consigo imaginar falar com a multidão e não falar de política. Eu falo de Deus, falo do próximo e falo do eu no meio dos outros. Tento pregar contra a ideia do “eu demais” e “Deus de menos”. Mas falo de política abertamente, porque não é possível construir uma sociedade sem religião e sem política. Eu prego as duas.

Fonte: Jornal O Povo

Da convivência à fraternidade



“Eu não rogo somente por eles, mas também por aqueles que vão crer em mim pela palavra deles. Que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim, e eu em ti. Que eles estejam em nós, A FIM DE QUE O MUNDO CREIA QUE TU ME ENVIASTES. Eu lhes dei a gloria que tu me deste, para que eles sejam um, como nós somos um: eu neles, e tu em mim, para que sejam perfeitamente unidos, e o mundo conheça que tu me enviaste e os amastes como amaste a mim” (Jo 17,20-23)


Para os cristãos, relações humanas não se resumem a postulados, princípios ou categorias filosóficas, sociológicas ou antropológicas. Relações humanas não se resumem, também, à simples convivência. Para nós as relações humanas possuem como fim último o cultivo da fraternidade. E bem sabemos que fraternidade é caridade (amor em movimento) e, portanto, dom de Deus. Desta forma, é graça do Espírito Santo. Caso contrário, não poderemos ser distinguidos como cristãos: “nisto reconhecerão todos que sois os meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,35).
E por que elas não se resumem à mera convivência? Porque Jesus as divinizou. O homem-Deus diviniza as relações humanas. Elas permanecem, por natureza, sendo humanas, mas agora são agraciadas pela benção e pelo poder de Deus. E é justamente por isso que elas deixam de ser apenas relações humanas para entrarem na esfera da fraternidade. Em outras palavras, Jesus elevou a convivência à condição de fraternidade.
E o que é fraternidade? Etimologicamente (ao pé da letra), significa união de irmãos. Mas por ser uma palavra muito usada não sabemos direito o que, na prática, ela significa. Não sabemos se existe um modelo a ser seguido. Mas quando lemos a Palavra de Deus descobrimos que existe sim um modelo (At 2,1-4; 42-47; 4,32-37).
A partir destas explicações iniciais é que podemos falar de relações humanas.
Para Giuseppe Colombero “o homem é virtuoso não só quando cumpre atos de fé ou de temperança, mas também quando é solidário com os seus semelhantes, quando compartilha com eles ‘as alegrias e esperanças, as tristezas e angústias... solidariedade significa abertura sincera e ativa a todos, abertura que atribui ao termo outro o sentido amplo e belo de todos nós. Uma moral que levasse em consideração exclusivamente a formação do indivíduo na qualidade de indivíduo e tivesse como objetivo tão-somente a sua auto-realização, ignorando a sua inserção no tecido social, seria uma moral teórica, abstraída da realidade. Temos uma identidade individual e uma social, devemos formar tanto uma como a outra, aprender a viver bem entre as duas vertentes do eu, a que se dirige para o íntimo de nós mesmos e a que vai em direção aos outros. Devemos saber estar bem conosco mesmos e com outros, amar o silêncio e a palavra, a solidão e o convívio”.
Mais a frente o mesmo autor diz: “estou convencido de que, se observássemos as boas maneiras ditadas pela boa educação, já seríamos metade santos. Seguramente seríamos mais aceitos pelos fiéis, mais ouvidos, seguidos e mais amados... a humanidade rica e sincera de um missionário é evangelizadora em si mesma no sentido de que revela o evangelho, de modo especial o Evangelho Vivo que é Cristo, em quem tanto crentes como descrentes vêem a encarnação da bondade”. Por fim, ele diz que é “preciso propor aos cristãos uma reflexão sobre a importância de certos aspectos do comportamento, como boa educação, respeito, delicadeza, cordialidade, solicitude e etc”.
Na sociedade de hoje, marcada pelo secularismo e relativismo religiosos, bem como pela idolatria e violência ou somos cristãos verdadeiros, cheios de fé, unção, parresia e fraternidade, ou seremos engolidos.
Senão vejamos: enquanto estamos, protegidos pelas paredes desta Igreja, achando que já fazemos muito, um número enorme de pessoas estão lá fora, no mundo, vivendo uma vida longe daquilo que Deus quer. Outro exemplo: pensamos muito como fazer a nossa catequese se tornar eficiente (que usa os meios adequados) e eficaz (que dá bom resultado)? Simples: sendo discípulo de Jesus. Caso contrário, devemos escolher outro caminho a seguir. Este é o segredo.
Graça e paz!

Francisco Edmar
AGDI